Para quem quer economizar tempo de vida e ir direto à resposta: Não. Na dúvida, não desconte nenhuma comissão de seus empregados.
Você pode ter pensado “Ah, mas a minha venda foi cancelada. Não vou receber o dinheiro do cliente e ainda vou ter que pagar a comissão ao empregado? Esse cara não sabe de nada. Vou descontar e pronto.”
Para você que pensou isso eu sugiro fortemente que leia o artigo até o final. Também para quem busca um conhecimento um pouco mais aprofundado sobre o assunto, vou explicar o motivo pelo qual a realização de descontos das comissões pagas (ou devidas) a seus empregados comissionistas é uma péssima ideia.
Primeiramente vamos definir o que são as comissões: Comissões são as partes integrantes da remuneração de um empregado e que variam de acordo com o desempenho daquele específico trabalhador. Comissões são, portanto, verbas variáveis que compõem, por força da Lei (mais especificamente o artigo 457, §1º, da CLT), a remuneração do empregado.
A remuneração, por sua vez, é utilizada como base de cálculo para pagamento das férias, do décimo terceiro salário, do FGTS e de eventuais horas extraordinárias realizadas pelo seu empregado.
Por esse mesmo motivo é que não se pode descontar da remuneração do empregado valores devidos a título de comissões. Elas integram a remuneração do empregado e o artigo 462 da CLT fala que é proibido ao empregador realizar qualquer desconto “dos salários” (aqui podemos entender a própria remuneração) do empregado, exceto nos casos expressamente permitidos pela Lei.
Assim, deveria haver uma previsão na Lei autorizando o desconto de comissões para que esse desconto fosse permitido e aceito.
Ocorre que a legislação (conjunto de Leis do nosso país) fala justamente o contrário.

Para entender esse ponto precisamos saber o que é conhecido no mundo jurídico por “princípio da alteridade”. Esse princípio nada mais é do que o entendimento predominante de que os riscos da empresa são sustentados pela própria empresa. Esses riscos não podem ser transferidos para o empregado. Para fazer mais sentido: A empresa deu lucro esse mês? Ótimo, pague o salário dos seus empregados. Ela deu prejuízo? Problema do empresário, siga pagando os salários dos seus empregados.
O lucro não é importante para a relação mantida pelo seu empregado.
Como o vendedor é o empregado que normalmente atua na linha de frente e costuma receber comissões pelas vendas realizadas, será ele utilizado como exemplo para ilustrar a questão da impossibilidade de realização de desconto de comissões.
Qual o trabalho exercido pelo vendedor? Entre outras atividades que ele pode realizar, a venda é a atividade principal que se espera de um vendedor. Pois bem, se o vendedor realizar uma venda e o cliente posteriormente se arrepender da aquisição do bem ou do serviço contratado, o trabalho realizado pelo vendedor deverá ser remunerado da mesma forma.
Isso significa que pouco importa se o produto ou serviço contratado foi aproveitado pelo cliente. Realizada a venda, o vendedor terá direito a manter sua comissão.
O risco do negócio (cancelamento do contrato) é todo do empresário, ou melhor dizendo, da empresa.
Fica mais fácil entender essa proibição de descontos quando pensamos em um empregado que atua na fabricação de um produto. Ele trabalha para produzir um sapato, por exemplo. Finalizado o sapato, o empregado cumpriu sua função. Se o empresário conseguirá receber pelo sapato produzido pouco importa àquele empregado. Ele deseja apenas o salário dele ou o valor da produção combinado por aquele par de sapatos.
O risco do negócio é da empresa.
Quando se pensa no vendedor e nas comissões, contudo, nota-se uma incapacidade de aceitação por parte dos empregadores sobre a impossibilidade de descontos das comissões.
Deixo aqui registrado que esse entendimento está presente e dominante no mais alto órgão da Justiça do Trabalho. Abaixo destaquei um julgado para que possam confirmar esse entendimento dominante no Tribunal Superior do Trabalho. Vejamos:
“AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. HORAS EXTRAS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS – DESNOERAÇÃO DA FOLHA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 126 DO TST. 1.1. A finalidade precípua desta Corte Superior, na uniformização de teses jurídicas, não autoriza a revisão do conjunto fático-probatório já analisado pelo Tribunal Regional, na esteira do entendimento consolidado pela Súmula 126/TST. 1.2. Na hipótese dos autos, não se trata de mero reenquadramento jurídico dos fatos, tendo em vista a efetiva necessidade de revolver o acervo probatório para adotar conclusão diversa daquela obtida pelo TRT. 1.3. As alegações recursais da parte, no sentido de inexistência de controle de jornada e de enquadramento na lei de desoneração da folha de pagamento, contrariam frontalmente o quadro fático delineado no acórdão regional. Em relação às horas extras, o Colegiado de origem assentou que “cabia à reclamada efetivamente demonstrar que a jornada do reclamante não era passível de controle, nos termos da exceção do art. 62, I, da CLT, ônus do qual não se desincumbiu”. No tocante aos recolhimentos previdenciários, consignou o Tribunal Regional, a partir do contrato social apresentado, que “não há indicação de que a primeira ré presta os serviços referidos nos §§ 4º e 5º do art. 14 da Lei nº 11.774, de 17 de setembro de 2008, nem os demais serviços descritos no art. 7º da Lei nº 12.546/2011”. 1.4. Desse modo, o acolhimento de suas pretensões demandaria necessariamente o reexame do acervo probatório, procedimento vedado nesta esfera extraordinária. 2. COMISSÕES. DESCONTOS. CANCELAMENTO PELO CLIENTE. IMPOSSIBILIDADE. 2.1. No caso dos autos, assentou o TRT ser “incontroversa a realização de estorno” e que “os riscos da atividade econômica corre por conta do empregador, na forma do art. 2° da CLT, sendo indevida a transferência desses riscos ao empregado”. 2.2. O entendimento pacificado nesta Corte Superior está posto no sentido de ser vedado ao empregador realizar desconto no valor das comissões sobre vendas efetuadas em decorrência de cancelamento ou inadimplemento do cliente, por implicar indevida transferência do risco do negócio ao empregado. 2.3. Estando a decisão regional em conformidade com a jurisprudência consolidada neste Tribunal, incide o óbice do art. 896, § 7º, da CLT. 3. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. 3.1. O art. 896, § 1º-A, I a III, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.015/2014, inseriu novo pressuposto de admissibilidade do recurso de revista, consubstanciado na necessidade de a parte indicar, em razões recursais, os trechos do acórdão regional que evidenciem os contornos fáticos e jurídicos prequestionados da matéria em debate, com a devida impugnação de todos os fundamentos adotados pelo Tribunal Regional, mediante cotejo analítico entre as teses enfrentadas e as alegadas violações ou contrariedades invocadas em seu apelo. 3.2. Na hipótese, nenhum trecho do acórdão recorrido foi transcrito pela parte nas razões de recurso de revista. 3.3. Com efeito, a ausência de transcrição e delimitação dos fundamentos fáticos e jurídicos relevantes para a compreensão da controvérsia implica defeito formal grave, insanável. Mantém-se a decisão recorrida. Agravo conhecido e desprovido” (Ag-AIRR-101142-04.2019.5.01.0204, 5ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 14/06/2024).

Dessa forma, concluo o presente artigo renovando a lição de que as comissões de seus empregados não devem ser descontadas, ainda que as vendas que originaram aqueles valores tenham sido canceladas pelos clientes. Conforme visto acima, nem mesmo se os clientes estiverem inadimplentes poderá o empregador realizar os descontos. O empregador possui a opção de cobrar seu crédito judicialmente, mas deve arcar com as comissões devidas ainda que o cliente esteja inadimplente.
E se ao ler esse artigo você pensou “Já sei! Então o jeito vai ser diminuir a comissão do meu vendedor!” eu sugiro que você se inscreva em nossa Newsletter para ficar por dentro da postagem que será feita na semana que vem, sobre diminuição dos salários dos empregados.
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